Os japoneses receberam os Jogos Olímpicos em outubro de 1964. Na ocasião, o verão nipônico já era implacável, uma vez que essa estação do ano em particular faz com que nossos vizinhos do outro lado do mundo sofram com altas temperaturas. O calor era tão intenso que obrigou o comitê organizador a mudar a data de realização dos jogos para o mês de outubro. Sendo assim, o que mudou nos últimos 57 anos?

As raízes do problema

Nas últimas décadas, o planeta Terra passou por algumas transformações irreversíveis devido a uma esmagadora interferência humana. A consolidação de cada vez mais indústrias e suas chaminés emissoras de poluentes, assim como o crescimento da população mundial e o consumo extremamente desigual entre os países, além da falta de comprometimento das nações em criar maneiras de desenvolver um futuro sustentável, são alguns dos pilares-chave nessa enorme estrada que o mundo faz questão de pavimentar. Essas ações – ou a falta de ações ecológicas – acabam por contribuir na intensificação do aquecimento global. A Terra naturalmente realiza um processo conhecido como o Efeito Estufa, que torna o ambiente seguro e habitável para os seres humanos. A radiação solar chega em nossa atmosfera e sofre interações com um grupo de gases presente em uma camada (pense na estufa) da própria atmosfera. Dessa reação, parte da radiação é retida e/ou “devolvida” ao espaço e parte dela segue seu rumo até o planeta, onde será posteriormente absorvida pela superfície, mares, etc. Esse Efeito Estufa é o responsável por manter as temperaturas médias do planeta em equilíbrio, porém, as interferências humanas, como a própria queima desenfreada de combustíveis fósseis devido à atividade industrial e o desmatamento de florestas e demais áreas verdes, faz com que haja muito mais gases do que deveria haver nessa estufa. Por consequência, a Terra absorverá uma quantidade de calor maior do que o processo natural permite, gerando drásticas mudanças climáticas. Portanto, o processo do aquecimento global, ou seja, o aumento das temperaturas médias do planeta, é decorrente da intensificação do Efeito Estufa. Como resultado, nosso planeta passa a sofrer grandes oscilações climáticas como enormes tempestades, furacões, secas, queimadas naturais em larga escala, aumento dos processos de desertificação, o derretimento das calotas polares, que traz o inevitável aumento do nível do mar, deixando partes de continentes submersas, alterando ecossistemas e extinguindo espécies para sempre. Certamente, o tom catastrofista do último parágrafo parece ser demais, e embora seja normal a Terra passar por eras mais quentes e eras mais frias, o aquecimento global é um dos principais problemas a ser combatido. Para isso, algumas famosas reuniões entre países já foram realizadas, como a Conferência de Estocolmo, em 1972, o Protocolo de Kyoto, em 1997 e o recente Acordo de Paris, firmado em 2015 com a intenção de limitar o aumento da temperatura global em 2?°C e que se viu por um fio após as eleições presidenciais que elegeram Donald Trump presidente dos Estados Unidos. O republicano tirou o país do acordo em 2017, que retornou graças a uma assinatura do atual presidente estadunidense Joe Biden. Trump era um ferrenho defensor da ideia de que o aquecimento global era uma mentira, afinal de contas se o nome é “aquecimento” por quais motivos ainda temos frio extremo em determinadas regiões do planeta? A confusão, embora pareça engraçada, é normal para muitos. A explicação está centrada em outra grande confusão: a diferença entre clima e tempo. O tempo são as condições climáticas de um determinado local em um curto período, como um dia ou uma semana. Já o clima se refere a um conjunto de fatores de uma região analisados, pelo menos, nos últimos 30 anos. Dessa forma, podemos dizer que o clima do sertão nordestino é o semi-árido, mesmo que, em dado dia do ano, haja chuvas. Fazer frio demais em determinada região do globo não significa que o aquecimento global não exista. O ponto principal é que a sua existência se intensificará nas próximas décadas, causando cada vez mais eventos extremos, tanto “frios ou quentes” demais.

E como fica o Japão e as Olimpíadas de Tóquio?

Depois da longa e necessária explicação dos parágrafos anteriores, retornaremos para o Japão e seu verão. O grande problema do país para os Jogos Olímpicos é que a sua temperatura média cresceu 2,8?°C no último século. Embora um aumento de pouco menos do que 3?°C possa parecer irrisório, é o suficiente para causar alterações importantes no bem-estar dos competidores e do público. Por serem realizadas entre julho e agosto, os meses mais quentes do país insular e impulsionado por mudanças climáticas, a grande preocupação dos organizadores era como proporcionar uma experiência agradável para os participantes. O ambiente quente úmido pode proporcionar episódios de insolação, exaustão e queimaduras, por exemplo. As temperaturas das ilhas japonesas nesse período do ano podem variar entre 30 e 31?°C, mas não é surpresa uma nova média de 34?°C chegando sorrateiramente. Nos últimos anos, os habitantes já sofreram com calor extremo e máximas de até quase 40?°C. Uma preocupação consistente foi a ampliação de ilhas de calor na cidade, impacto ambiental urbano causado pelo excesso de edifícios, asfalto, concreto e carros. Todos esses fatores contribuem para a retenção de calor em áreas específicas da cidade, aumentando a temperatura nos grandes centros.

A estratégia japonesa e o futuro dos Jogos

Para compensar os possíveis problemas, o Japão investiu na criação de áreas verdes ao redor de Tóquio para minimizar a concentração de calor. Além disso, algumas provas sofreram reajuste de horários para haver mais locais com sombra, mais de uma tonelada de gelo, ventiladores de névoa, muita água e… sorvete. A maratona foi movida para a cidade de Sapporo, região mais ao norte de Tóquio, na ilha de Hokkaido e com temperaturas mais amenas. Um dos trunfos foi a criação de um sistema de resfriamento no telhado do Estádio Nacional de Tóquio. O mecanismo superior cria uma passagem fácil para o interior da obra, refrescando os assentos, além de uma tecnologia que armazena água das chuvas para ajudar na irrigação. No entanto, embora sejam ações interessantes, estamos falando de apenas paliativos e não a solução do problema. O Comitê Olímpico Internacional aprovou em março de 2020 que a partir de 2030 os Jogos Olímpicos deverão ser “positivos para o clima”, mas já em 2024 teremos um vislumbre do projeto nas Olimpíadas de Paris. A intenção é a de honrar as tratativas do Acordo de Paris e reduzir a emissão de gás carbônico.

A medalha de ouro está longe

O aquecimento global não será minimizado com apenas algumas decisões do Japão ou iniciativas das Olimpíadas. A medalha de ouro para um futuro ecologicamente sustentável e que continue a proporcionar condições de habitação para o ser humano e outras espécies animais e vegetais será esforço de uma tarefa conjunta com o mundo. Infelizmente, não estamos perto do pódio. Comparativamente, as grandes potências do globo como os Estados Unidos e China são os maiores emissores de gases poluentes, com o conjunto de nações que compõe a União Europeia. O Brasil, embora não seja um grande culpado nesse setor, continua ávido em destruir toda a Floresta Amazônica e continuar fomentando o cenário de extração ilegal de madeira, ligado ao desmatamento e principalmente ao avanço da fronteira agropecuária. A floresta, que esteve sempre como uma aliada na absorção de gás carbônico, agora está liberando mais gases do que consegue armazenar. A causa é simplesmente exposta pela devastação de grandes áreas da floresta, que infelizmente passa a contribuir para o aquecimento global. Para o futuro, basta torcer e esperar que nossos líderes entendam o discurso das mudanças climáticas não como um dever para seus países, mas sim como uma obrigação imediata. As consequências nefastas dos processos de alterações climáticas não estão inseridas apenas na ordem natural das coisas. Fechar os olhos para o aquecimento global não significa apenas se omitir de catástrofes naturais e a perda de uma biodiversidade única, mas também fomentar um processo de genocídio de populações mais pobres e marginalizadas, que pagam com o consumo irreal dos mais ricos. Fontes: Nasa, EuroNews, National Geographic, UNEP, CNN, Japan Times, IOC

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Outra excelente matéria que também aborda a problemática do aquecimento global comenta sobre um episódio em que São Paulo registrou a temperatura mais alta de sua história.

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